terça-feira, 28 de setembro de 2010

José Mattoso, Susanne Daveau e Duarte Belo: Portugal, O Sabor da Terra


           Li o livro há já algum tempo. Entretanto, fui de férias: saída de Guimarães, travessia rápida (mas deslumbrante, como sempre) do vale do Douro, descida pela Beira Alta, exploração afincada dos recantos da serra da Estrela, súbita plana tranquilidade da Beira Baixa, entrada plena no Alentejo profundo, mergulho com o olhar nas águas do Alqueva do alto de Monsaraz, esfuziante costa algarvia, mais Alentejo, chuvas de Agosto pelas báquicas colinas Estremenhas e regresso ao Norte, enfim. Quase 2500 quilómetros, o espaço de meia Europa preenchida com (muito) diversa portugalidade.


        Não surpreende, como tal, que tenha lido o livro como uma espécie de preparação teórica para a viagem que se avizinhava. O título, de resto é suficientemente poético para fazer sonhar, enquanto o subtítulo resguarda uma decidida promessa de respeitável rigor científico. E assim é, com efeito.


           Muito mais recentemente decidi-me a escrever duas palavras sobre este livro durante uma viagem entre Mirandela e Guimarães. Afinal, o Norte é o meu espaço natural (sou transmontano, vivo em Guimarães, com o Porto como Alma Mater e uma marcante passagem por Leiria). Conduzindo pela estrada nacional que liga Murça a Vila Pouca de Aguiar, contemplando a paisagem alterada pela distância percorrida, interrogava-me sobre essa relação ambígua que mantemos com a terra. Parado numa reentrância da estrada, com muitas dezenas de quilómetros quadrados aos meus pés, de mapa na mão e olhar esquadrinhando o relevo, tive a impressão de que, mais do que qualquer mistério telúrico, era a mim próprio que procurava. Ali, por detrás da serra dos Passos, Mirandela, a cidade onde cresci; para lá da Nogueira, a última elevação visível no horizonte, fica Bragança, onde nasci. Diante de mim, a serra do Faro, balizando o vale do Tua, rio em que nadei, apanhei rãs e cobras de água, plácido curso de água a cuja beira li histórias de mares e países distantes. Muito ao longe adivinha-se o majestoso vale do Douro, rio que via da janela nos meus anos de estudante universitário. Tudo isto me fez e, marginalmente, também eu faço tudo isto. Sou o significado e o significante desta paisagem, eu e tantos como eu, em todas as épocas do mundo. A paisagem escreve-me, e eu escrevo-a com o olhar, e desta simbiose se faz a história. Dos caminhos e das viagens nos nutrimos. A isso convida este livro, a viajar, a sermos nós próprios e outros ao mesmo tempo, dentro deste país simultaneamente tão estranho e tão próximo.


             Bibliografia: MATOSSO, José, DAVEAU, Suzanne, BELO, Duarte (2010). Portugal: O Sabor da Terra - Um retrato histórico e geográfico por regiões. Lisboa: Círculo de Leitores

Sem comentários:

Enviar um comentário