segunda-feira, 4 de julho de 2011

The King's Speech, Tom Hooper (2010)

   
      Vi Colin Firth em A Single Man há uns tempos (http://a-espera-de-godot.blogspot.com/2010/05/single-man-tom-ford-2009.html). Na altura foi uma surpresa; desta vez já não. As expectativas iam, portanto, extremamente elevadas para este filme. Para mais, tive de esperar bastante tempo para o ver: com efeito, demorou um pouco a chegar ao Cineclube de Guimarães…
        Lembro-me de ouvir na rádio uma entrevista ao Colin Firth, na sequência dos Óscares. Dizia, e cito de cor, não saber grande coisa sobre Jorge VI antes de ser abordado para o papel; ficou surpreendido quando começou a estudar a figura histórica ao descobrir a “história de uma dignidade tranquila”. O perfil do papel assemelha-se, portanto, àquilo que Firth fez em A Single Man.
                                No entanto, ao contrário do filme anterior, que era em boa medida um one-man-show, em The King’s Speech há também Geoffrey Rush e Helena Bonham Carter. Ingleses, ou quase (Rush é australiano), estes actores fazem-me sempre pensar em palcos de teatro, mais do que em telas de cinema. E, por conseguinte, fazem-me também pensar na figura tutelar da literatura inglesa. O filme é, de certo modo, um tributo, um filme de actores, aparentemente feito para homenagear esse outro autor, William Shakespeare. As referências abundam: inter-textos shakespearianos, de Macbeth a Hamlet, peças sobre reis assombrados pelos seus predecessores, peças sobre a audácia e o medo, bom… Quando se fala de Shakespeare é mais fácil dizer, simplesmente, peças sobre tudo, até sobre o que ainda não foi sequer sonhado.
                             Reverbera, ainda a propósito de Shakespeare, o comentário de Jorge V sobre a rádio. Na Inglaterra isabelina, no tempo em que o Bardo pisou os palcos, a reputação social dos actores era baixa. Ralé entre a ralé, era assim que estes eram vistos, ainda que nas suas vozes os maiores heróis da História regressassem à vida transmutados em poesia. O velho rei Jorge V, depois de uma pausada saudação de Natal aos seus súbditos transmitida na rádio, repreende o seu filho gago. Os líderes do séc. XX teriam de falar para rádios (e televisões, depois). Teriam de sorrir e de acenar, teriam de inspirar multidões. Teriam de descer à categoria da ralé entre a ralé, teriam, em suma, de ser actores.