segunda-feira, 24 de maio de 2010

A Single Man, Tom Ford (2009)


       Há dias assim, em que o acaso nos oferece um presente; em que um acto indolente se transforma numa revelação; em que duas horas marcam a nossa imaginação para sempre. Ir ao cinema ver A Single Man foi tudo isso. Primeiro filme do estilista americano Tom Ford, A Single Man (traduzido para português como Um Homem Singular) adapta um texto fundador da literatura gay, obviamente auto-biográfico, do escritor inglês Christopher Isherwood. Do ponto de vista da narrativa, o filme retrata o último dia da vida de um professor despedaçado pela morte do seu companheiro de longa data. Resumidamente, o filme é um conto existencial sobre a busca de um significado para a vida, para a morte, para o amor. O resto é poesia, movendo-se o protagonista num registo elegíaco, em que os seus estados de alma são subtilmente marcados por variações de cores, entre a exuberância e o cinzentismo. Colin Firth é simplesmente impressionante. Num estilo contido, supremamente elegante, limpo e preciso, Firth deixa-nos abismados com a dignidade trágica que consegue emprestar à sua personagem. Mas o que realmente importa destacar para lá de um enredo (só aparentemente) simples, é o que este filme representa em termos estéticos. Sem dúvida, estamos perante um assaz arrojado exercício de estilo, um filme que aspira, desde o primeiro instante, a construir arte. Afinal, de que outra forma poderíamos definir aquelas sequências epifânicas em câmara lenta, em que o mais profundo significado de um gesto é revelado pela precisão de uma imagem envolta pela maravilhosa música de Shigeru Umebayashi e Abel Korzeniowski? O cheiro doce do pelo de um cão, o contorno dos lábios de uma mulher, o arrepio da água na pele, o silêncio... Ford escreve poemas com a câmara, haikus feitos com película, pedaços de infinito a 8 milímetros... O cinema raramente é melhor do que isto.

sexta-feira, 21 de maio de 2010

Paulo Eduardo Carvalho

                    Paulo Eduardo Carvalho, homem do teatro, tradutor, encenador, foi meu professor na FLUP. Era um homem que respirava literatura, apaixonado pela palavra e pelo gesto. A melhor forma de ilustrar o vazio que o seu desaparecimento deixa em mim é listar o que li com ele: The Birthday Party, de Harold Pinter; Waiting for Godot, de Samuel Beckett; Translations, de Brian Friel; Cloud Nine, de Caryl Churchill; várias peças de William Shakespeare entre outros textos fascinantes.