segunda-feira, 9 de janeiro de 2012

La Meglio Giuventù (A Melhor Juventude), Marco Tullio Giordana (2003)



                 Por vezes o cinema apenas entretém, por vezes nem isso, por vezes faz-nos pensar, outras vezes, no entanto, inspira-nos e comove-nos, faz vibrar em nós cordas que o quotidiano apressado tenta emudecer. La meglio giuventù é um destes filmes: um longo intervalo no quotidiano apressado, forçado pelos seus 366 minutos de duração, tão densos de emoção e temas fortes que passam num ápice. Tinha-o visto há não muito tempo, mas uma viagem até Itália entretanto feita suscitou-me a vontade de o rever.
                O filme é tributário da longa tradição neorrealista italiana, dando continuidade aos dramas familiares habituais no cinema transalpino (e suas ramificações, porventura mais conhecidas, como O Padrinho de Copolla) e eloquentemente demostrando, a esse respeito, a vitalidade da tradição (de facto, o único momento em que se introduz um pouco de realismo mágico à maneira sul-americana acaba por ser comparativamente embaraçoso: a sério, deixem isso para o Almodóvar…). De resto, o filme é um excelente exemplo da sensibilidade humana que aprendemos a apreciar (e a esperar) no cinema italiano. Folhetinesco no melhor sentido da palavra, La meglio giuventù é essencialmente um filme sobre a Itália, feito sem grandes preocupações de inovação formal e colocando toda a ênfase naquilo que é realmente fundamental em cinema: a arte de bem contar boas histórias. O registo vagamente épico, com ecos homéricos entrecruzados com diversas referências culturais italianas, consegue produzir uma síntese credível entre a história contemporânea de Itália e o percurso das personagens. Das cheias de Florença à luta contra a máfia, das manifestações estudantis à integração europeia, do terrorismo vermelho aos desapontamentos da globalização, o filme é um belo e absorvente fresco de uma juventude que efetivamente mudou o mundo, mudando-se a si própria no caminho. De o rever sobrou-me, no entanto, a impressão reforçada de que o cinema não é História, mas sim Arte (até porque há histórias na História que só a Arte pode contar). E, com efeito, o filme transcende largamente a narração e revisitação históricas para almejar a algo muito superior, que é aquela indefinível, inefável, inenarrável chama que anima a vida a que, por falta de uma palavra melhor, chamamos sonho.
                Esta crítica poderia, portanto, começar no fim do filme, no Cabo Norte, no sítio onde o mundo, o tempo e os homens reencontram a sua ilusória circularidade e em que o sol da meia-noite, levemente afagando a fria superfície do oceano para de novo se erguer traduz não um verdadeiro fim: apenas um reinício, uma simbólica continuidade, o ténue fio tecido de memória e esquecimento, preservação e destruição, que liga as gerações entre si. 



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